Christiane Ramos
Acadêmica do 3° semestre de Relações
Internacionais da UNAMA
O sumo pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana, O
Papa Francisco, realizou uma visita de três dias ao Oriente Médio. O ato do
líder católico revela a grande importância dos valores na dinâmica atual do
sistema internacional (SI). Este fato não deve ser analisado apenas como uma
questão religiosa, mas, como uma ação política capaz de transformar a realidade
do lugar. Se algo é considerado relevante em Relações Internacionais quando
afeta a dinâmica do SI, então, uma análise sobre a viagem do Papa ao Oriente
Médio é de extremo destaque.
Os acontecimentos históricos são imprescindíveis para
entender o conflito atual entre Palestina e Israel. As causas recentes remontam
ao fim do século XIX, quando os judeus, até então um povo sem Estado, viviam
dispersos, tanto no próprio Oriente Médio, quanto na Europa. Havia entre os
Judeus a ideia de uma “terra prometida” situada na Palestina. Entretanto, o
lugar já era habitado por maioria árabe.
Com os horrores da Segunda Guerra Mundial (Holocausto), a
Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou em 1947 a criação de um Estado
israelense, que passou a existir em 1948. A migração em massa para, agora
Israel, iniciou. E as insatisfações apareceram. O conflito entre os dois povos
não cessa desde então.
Os seguidores de teorias positivistas certamente não
entendem a importância da visita do Papa ao Oriente Médio. Eles acreditam em
uma lógica permanente na política internacional. Que o poder de um agente pode
ser quantificado. Questões materiais (militar – bélico, econômico) são
exaltadas.
Em contraposição, os pós-positivistas veem o poder de
forma qualitativa. Ideias, crenças, valores e cultura, ou seja, aspectos
imateriais são mais importantes. De nada vale armamentos ou exércitos, se esta
ideia não é difundida.
Por isso, a religião, como valor, é de extrema
importância para a política internacional. Para o construtivismo, o papel dos
líderes é fundamental. Aliás, mais do que eles mesmos, suas personalidades. O
Papa Francisco se mostra sempre aberto às discussões. Não só às questões
dogmáticas da Igreja Católica, mas às relações entre os agentes e mudanças no
cenário internacional.
A imagem com a legenda “El abrazo de 3 religiones” possui
um grande valor simbólico: o Papa conseguiu reunir forças religiosas que
possuem uma luta histórica – palestinos e israelenses – cujo relacionamento
cultivado está sendo de grande conflito e de não aceitação recíproca. Constroem
intersubjetivamente a ideia e a realidade conflituosa.
O Papa Francisco pede incessantemente “Paz”. Contudo, esta
não possui uma existência ontológica.
Não se poderá vislumbrá-la se ambos os lados, que se relacionam, não
alimentarem a intenção de construí-la. Os judeus já possuem um Estado
legitimado pela comunidade internacional. Contudo, os palestinos ainda não
podem sentir orgulho por um Estado próprio.
Alexander Wendt é considerado um “meio-termo” nas
Relações Internacionais, assim como Emanuel Adler. Isto significa que por mais
que considerem a estrutura como mutável, que não há existência ontológica das
coisas do mundo e que valores imateriais são indispensáveis, a estrutura pode
em algum momento se apresentar do modo como os positivistas a enxergam. Wendt
inclusive, diz que a “anarquia é o que os Estados fazem dela”, portanto, é
construída, produzida intersubjetivamente e se torna um senso comum.
Logo, pode-se acreditar, sim, que o Estado seja uma
possibilidade para a política mundial. Mas o que é uma política de Estados hoje
poderá não ser futuramente. A realidade é socialmente construída e mutável. O
estado poderá perder importância e deixar de existir.
O desejo de paz não está sendo apenas uma vontade
religiosa. Quando esteve no Oriente Médio, o Papa Francisco convidou o chefe
político israelense, Shimon Peres e o líder palestino Mahmud Abbas para um
encontro histórico em Roma, que aconteceu no último dia 08 de junho, domingo.
O encontro foi marcado pelo cunho religioso. Contudo,
percebe-se o teor político. O Papa afirmou que aquele era um momento de trégua
(no conflito). Na véspera do encontro, em sua conta oficial no Twitter, disse
que “a oração pode tudo”. Ou seja, a questão religiosa tem tanto poder de
contribuir para a construção social das relações internacionais, quanto o armamento
e a economia, por exemplo.
Assim, por meio de questões de valores e crenças,
tenta-se mostrar para os amantes do realismo que a construção de uma realidade
pacífica é possível se os agentes trabalham para isso. Não será uma suposta
“anarquia estrutural” a definir a identidade e interesses dos agentes. Esta
definição só é possível quando eles se relacionam – a identidade relacional.
A realidade atual que foi construída por ambas as partes
é de rivalidade. Em meio ao conflito, a construção não levará nem a cooperação,
nem à paz. Os conflitos entre as partes são intensos e abarrotados pelos
valores de cada um. Não há entendimento. Assim, é bastante difícil de chegar a
um consenso. Mas, se ambos resolverem que a paz seja possível e agirem de forma
a construí-la, chegarão a este fim. No construtivismo há transformações. Não se
sabe para onde elas caminham. A única certeza é de que relações pacíficas tem
uma grande chance de gerar cooperação. A paz é socialmente construída.
A Palestina constrói juntamente com os outros agentes a
ideia de que os Estados são necessários. Se a relação entre eles expressa isso,
logo a Palestina pensará e agirá também a legitimar esta realidade – a relação
entre os agentes constrói a estrutura, e a estrutura influencia os agentes.
Cabe agora esperar para ver o que será feito das relações
entre Palestina e Israel, e como o Ocidente se comporta diante delas. Na
estrutura, não somos apenas atores fadados a interpretar um papel artificial,
mas devemos participar ativamente da construção social das relações
internacionais. Assim, agindo como verdadeiros agentes. Transformadores da
própria realidade.
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