Um nome ímpar da cultura brasileira, Vinicius de
Moraes cujo centenário de nascimento o país celebrou no sábado (19/10/2013),
foi muito mais do que o poeta de primeira grandeza e cantor e compositor, foi
um intelectual de muitas facetas.
Marcos Silva
Graduando em Relações Internacionais
UNAMA
Marcus Vinicius
de Melo Moraes nasceu em 19 de outubro de 1913 no bairro da
Gávea, na Cidade do Rio de Janeiro. Filho de Clodoaldo Pereira da Silva Moraes,
funcionário da Prefeitura, poeta e violinista amador, e Lídia Cruz, pianista
amadora. Vinícius é o segundo de quatro filhos.
Vinicius
de Moraes iniciou o Curso Secundário no Colégio Santo Inácio, famoso colégio
Jesuíta. Lá começa a cantar no coro do colégio nas missas de domingo. Em 1929,
concluiu o ginásio formando-se bacharel em Letras e no ano seguinte, ingressa
na Faculdade de Direito do Catete, hoje Faculdade Nacional de Direito (UFRJ). Na
"Faculdade do Catete", ingressa no Cajus, o Centro Acadêmico de Estudos Jurídicos e Sociais, lá
Vinicius convive com mestres como Otávio de Faria (romancista que incentivou
sua vocação literária) e San Thiago Dantas
(que foi professor, deputado federal, ministro da Fazenda, ministro das
Relações Exteriores, e um dos criadores da chamada "Política Externa
Independente" (PEI) durante o período "parlamentarista" do
governo João Goulart).
Vinicius
de Moraes graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais em 1933. Três anos depois,
obteve o emprego de censor cinematográfico junto ao Ministério da Educação e
Saúde. Dois anos mais tarde, Vinicius ganhou uma bolsa do Conselho Britânico
para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford. Essa foi a
primeira bolsa que o Conselho Britânico deu a um estudante brasileiro. Após o
começo da Segunda Guerra Mundial, Vinicius se viu obrigado a voltar para o
Brasil, não concluindo sua bolsa de estudos.
Em
1941 empregou-se como crítico de cinema no jornal "A Manhã", tornando-se
também colaborador da revista "Clima" e trabalhando como assessor
jurídico no Instituto dos Bancários.
Em
1942 fez concurso para o Ministério das Relações Exteriores (MRE), foi reprovado.
Em 1943, concorreu novamente e desta vez foi aprovado. Em 1946, assumiu o
primeiro posto diplomático como vice-cônsul em Los Angeles. Com a morte do pai,
em 1950, Vinicius de Moraes retornou ao Brasil. Nos anos 1950, Vinicius atuou
no campo diplomático em Paris e em Roma, onde costumava realizar animados
encontros na casa do escritor Sérgio Buarque de Holanda.
Como
poeta, Vinicius de Moraes foi expoente da segunda fase do modernismo no Brasil.
Vinicius foi ao longo da sua vida identificado como o poeta, porém foi um
grande letrista. No começo da sua criação, dedicava-se principalmente a poesia.
Mais tarde - naquilo muitos chamam de segunda etapa da sua vida- começou a dedicar-se a música, não deixando a
poesia de lado, mas unindo as duas em mistura que tem nos envolvido até hoje.
Com
uma vasta formação e uma visão de mundo holística, Vinicius enveredou para o
caminho da Dramaturgia, e foi exatamente essa faceta – a de dramaturgo – que o
aproximou de Tom Jobim em um encontro, que foi fundamental na trajetória de
ambos e um marco na cultura brasileira.
Em
1956 Vinicius de Moraes iniciou parceria com Tom Jobim para compor músicas para
sua peça Orfeu da Conceição. Definida por ambos como “tragédia carioca em três
atos”, a peça é uma transposição da história do mito grego de Orfeu para uma
favela do Rio de Janeiro. Escrito em 1954, o texto também estava sendo adaptado
para o cinema, com o título de Orfeu Negro, pelo cineasta francês Marcel Camus.
O filme, que ficou pronto em 1959, ganhou – como produção francesa – a Palma de
Ouro do Festival de Cannes e o Oscar de melhor filme estrangeiro.
A
parceria com Tom, iniciada com as canções para a peça – as mais conhecidas são:
Se todos fossem iguais a você e Lamento no morro, deu início a um movimento de
renovação da música popular brasileira. Dois anos depois, em 1958, com João
Gilberto e a sua inovadora batida no violão, e o lançamento do LP Canção do
Amor Demais, com Elizeth Cardoso interpretando composições da dupla, esse
movimento, que começava a ganhar forma, logo iria ser chamado de Bossa Nova.
Segundo o crítico musical Tárik de Souza, “Vinicius de Moraes foi um divisor de
águas na história da música popular brasileira. Um poeta de livro que de
repente se torna letrista e traz para as letras da música brasileira uma grande
densidade poética”.
No
ano de 1958 foi lançado o LP Canção do Amor Demais, que inclui a música Chega
de Saudade, composta por ele e Tom Jobim, marco do movimento da Bossa Nova. Nas
décadas seguintes ele participaria no movimento com diversas parcerias: Baden
Powell, Carlos Lyra, Edu Lobo, Francis Hime, Pixinguinha, Tom Jobim e Toquinho.
Em 1965 ganhou primeiro e segundo lugares no Festival de Música Popular da TV
Excelsior, com as canções Arrastão, parceria com Edu Lobo, e Canção do Amor que
não Vem, parceria com Baden Powell. Vinicius fez letras também para o clássico
choro Odeon, de Ernesto Nazareth (1863-1934), e para duas composições de
Pixinguinha (Lamentose Mundo Melhor).
A
obra de Vinicius inclui desde músicas erudita, há canções em que ele foi autor
de letra e música, dispensando as parcerias, como Pela Luz dos Olhos Teus,
Serenata do Adeuse Rancho das Flores. Poemas seus, que foram publicados
anteriormente em livros, ganharam música, como os sonetos da Separação,
musicados por Tom Jobim, e da Fidelidade, pelo pernambucano Capiba. O poema Rosa
de Hiroshima ganhou nos anos 70 música de Gerson Conrad, líder da banda Secos e
Molhados, eternizado na voz do cantor Ney Matogrosso. Sem falar na música
Garota de Ipanema em parceria com Tom Jobim, que é a música brasileira mais ouvida
no mundo.
VINICIUS DE MORAES, O
DIPLOMATA
Vinicius
de Moraes além de ser um dos maiores poetas em língua portuguesa de todos os
tempos, grande compositor, letrista, cantor e dramaturgo, também enveredou-se
para o campo da diplomacia.
Como
citado anteriormente, Vinicius ingressou no Itamaraty por concurso, em 1943,
serviu em Los Angeles, Paris, Roma e Montevidéu, chefiou delegação brasileira
na UNESCO. Cultivou grandes amizades e muita admiração nos círculos artísticos
e diplomáticos que em que frequentou. Foi aposentado compulsoriamente em 1969.
Após
26 anos de serviços prestados ao MRE, Vinicius foi aposentado compulsoriamente
através do Ato Institucional Nº 5 - redigido pelo ministro da justiça Luís
Antônio da Gama e Silva em 13 de dezembro de 1968, a “lei” entrou em vigor
durante o governo do então presidente Artur da Costa e Silva. No dia em que o
ato era editado, Vinicius encontrava-se em Portugal onde realizava um concerto
ao lado de Chico Buarque de Hollanda e Nara Leão e lá, como forma de protesto,
recitou no palco seu poema Pátria Minha. Quando o Presidente
Arthur Costa Silva ficou sabendo do ato de repúdio, emitiu ordem direta para
que Vinicius fosse exonerado do Itamaraty e junto com ele muitos funcionários
que não eram alinhados com o governo ditatorial.
Esse fato
abalou Vinicius de Moraes, que, cassado em seus direitos e
obrigado a se aposentar da carreira diplomática, sofreu na pele o que tantos
outros brasileiros sofreriam nos anos de chumbo. Vinicius pediu informações oficiais
sobre a sua aposentadoria, recebendo apenas a afirmação de que fora aposentado
porque a sua vida boemia de frequentador de botequins e tocador de violão, não
condizia com a carreira pública.
Em
21 de junho de 2010, para corrigir esse erro, o Ex-Presidente Lula sancionou a
lei que promoveu Vinicius de Moraes ao cargo de Embaixador post mortem, reintegrando-o aos quadros do Ministério das Relações
Exteriores, ocasião em que também foi inaugurado o “Espaço Vinicius de Moraes”
no Palácio do Itamaraty - Rio de Janeiro (RJ). Nas palavras do ex-ministro das
Relações Exteriores, Celso Amorim, essa atitude teve dois propósitos:
“A promoção póstuma de Vinicius de Moraes a Ministro de
Primeira Classe da carreira diplomática teve duplo propósito. O primeiro foi
reverter a injustiça perpetrada pelo regime militar, que aposentou
prematuramente o então Primeiro Secretário como parte do movimento de “caça às
bruxas” no serviço público. Por outro lado, a homenagem póstuma a Vinicius
representa um reconhecimento a sua enorme contribuição à divulgação da imagem
do Brasil no exterior. Garota de Ipanema, fruto de sua prolífica parceria com
Tom Jobim, é das canções mais tocadas em todos os tempos. Vinicius cantou o
nome e as belezas do Brasil mundo afora. Traduziu na música e na poesia os
ideais da diversidade racial. Foi, sem dúvida, um grande Embaixador da cultura
popular brasileira.”
Vinicius
foi uma figura importante para o Brasil. O poeta e compositor de renome, homem
público bem articulado, que nutria um círculo de amizade invejável - que vai de
Manoel Bandeira, Mário de Andrade e João Cabral de Melo Neto, passando por
Pablo Neruda, Di Cavalcante e David Siqueiros, terminando em Antônio Maria e Alberto
Cavalcanti, isso sem contar Carmem Miranda e Alex Vianny, Gregg Toland e Orson
Welles e o Oswaldo Aranha.
Por
fim, não há nenhuma dúvida de que Vinicius de Moraes foi um personagem
inseparável da cultura brasileira. Sua vida foi marcada por muitos fatos,
dentre os fatos dramáticos, nenhum lhe deixou mais indignado como a sua
aposentadoria compulsória (com ares de expulsão) do Itamaraty. Vinicius foi
injustamente aposentado da carreira diplomática por não se encaixar exatamente
no modelo de funcionário público imaginado pelos militares-presidentes, mesmo
sendo um diplomata competente, que cumpria suas funções com maestria. Foi e
sempre será um ícone do panorama cultural do Brasil.
Vinícius
é Fundamental!
FONTES:
EMBAIXADOR DO BRASIL. Vinícius de
Moraes. Brasília : FUNAG, 2010.
CASTELLO, José. O poeta da paixão. São
Paulo: Companhia das Letras, 1994.
CASTRO, Ruy. Chega de saudade: a história e as histórias
da Bossa Nova. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
MOISÉIS, Carlos Felipe (org.). MORAES,
Vinicius. Vinícius de Moraes. São Paulo: Revista Educação. Abril Educação,
2005.
AGENCIA BRASIL. O Poeta popular: Vinicius de
Moraes. Disponível em <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-10-18/poeta-popular-vinicius-de-moraes-foi-um-intelectual-de-multiplas-facetas>
Acessado em: 18/10/2013.
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