quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A Sorte de Sêneca.



Adriano Bastos Rosas,
Acadêmico do 5o Semestre de Relações Internacionais da UNAMA.

Henrique Pizzolato.
            A Ação Penal 470, mais conhecida como o “Caso do Mensalão” acabou – com o recente capítulo da fuga de um dos condenados, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato – por mostrar que o campo das Relações Internacionais pode reservar surpresas desagradáveis para atores que agem com descuido em suas interações para com seus semelhantes. Mais do que discutir se há ou não possibilidade de extradição, a qual é deveras ínfima diante da conclusão da situação Cesare Battisti (2009), parece mais profícuo utilizarmos daqueles para analisar as diferenças entre crime político e crime de motivação política.
            A legislação brasileira no que se refere a quais condutas são tipificadas como crime político adota na Lei 7170, de 1983, um critério objetivo-subjetivo para delimitar e diferenciar essa especificidade em contraste com os crimes comuns. Quando interpretada em conjunto com o art. 14, parágrafos 1o e 2o da Declaração Universal dos Direitos Humanos e com o art. 6o do Tratado e Extradição entre os dois países, fica evidente que a extradição de Pizzolato não é simplesmente difícil – é facultativa – mas também desperta dúvidas quanto a natureza do crime para ser considerado político ou não.
Cesare Battisti
            No caso de Battisti, condenado na Itália com sentença de prisão perpétua com trânsito em julgado pelo homicídio de quatro pessoas, o que se percebe não é um crime político, mas sim um crime comum com elementos de motivação política. Na lei brasileira, a diferença se faz principalmente porque o crime político visa atingir os direitos políticos do cidadão – como o sufrágio e representação política – e/ou o sistema político do país. Todavia, em casos como de terrorismo, o texto constitucional deveria prevalecer já que o art. 4, VIII afirma claramente o “repúdio ao terrorismo e ao racismo” no país. Não é pacífico, contudo, o raciocínio de que o homicídio praticado por Battisti possa ser considerada atividade terrorista, e muito menos configurar crime político.
            Por sua vez, no que se refere ao caso de Pizzolato, a situação se distancia ainda mais da hipótese de o criminoso poder ser enquadrado na situação de crime político, já que ficou claro que sua motivação se dirigia a crime comum, buscando adquirir vantagens para si, inexistindo também o elemento do terror se encontra aqui presente.
Então por que seria este último mais preocupante que o primeiro? Sobremaneira porque ele, tanto do ponto de vista doméstico quanto internacional, é muito mais prejudicial ao Brasil do que o caso Battisti figurou na Itália.
            A explicação para esse impacto não é outro senão uma somatória de fatores temporais e conjunturais. O caso Battisti, além de ser uma condenação antiga – da década de 1970 – se beneficia do imaginário internacional hodierno do terrorismo internacional, o qual associa a “face” do terrorismo de forma quase indizível da figura do muçulmano fundamentalista em contraste à aparência do “comunista europeu” do réu italiano. No momento da decisão pela não extradição, em 2009, o governo brasileiro optou pela proximidade político ideológica em detrimento do ideal de democracia e pacificação fortemente propagado – ao menos em discurso – no Sistema Internacional atualmente. O Estado, portanto, atraiu tanto olhares de desconfiança no sistema como um todo quanto feriu o “orgulho” europeu, uma atitude esdrúxula diante das pretensões do país em ingressar no Conselho de Segurança da ONU no período.
            A fuga de Pizzolato, em contraposição, faz referência não apenas a um fato recente, mas atual. Em primeiro lugar, a memória do caso Battisti e a inversão dos papéis – agora o Brasil como “refém” da soberania italiana no processo de extradição – confere a Itália uma oportunidade ímpar de resposta a atitude brasileira. Caso aceitasse extraditar o réu, o país europeu pareceria “fraco” e “subserviente” as vontades da nação verde-amarela. É internamente, todavia, que o governo brasileiro enfrenta as consequências mais graves, se tornando paulatinamente cada vez mais desacreditado diante dos clamores por maior seriedade nas políticas públicas e na incompetência em impedir que a corrupção, um dos males mais aparentes no país, continue impune mesmo após as manifestações populares e atos de vandalismo que vem ocorrendo ao longo deste ano. Se o governo brasileiro conseguirá encontrar mecanismos eficazes e eficientes para estimular oportunidades de estabelecer uma relação de comunicação e confiança com sua própria sociedade e com seus pares internacionais a médio e/ou a longo prazo só há uma certeza:
“A sorte está lançada!”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário