sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

O PNUMA: Governança Global Ambiental e Governamentalidade.



Arantxa Santos,
Concluinte do curso de Relações Internacionais da UNAMA.


Desde os primórdios da humanidade, o homem utiliza os recursos naturais para a sua sobrevivência, extraindo do local onde estava aquilo que precisava para se alimentar, mas no instante que este recurso se tornava escasso, ele se locomovia para outro local. Esse ciclo permaneceu até o momento em que o homem aprendeu a plantar e cultivar o alimento de que necessitava, iniciando assim, uma nova definição para a relação homem-natureza.
Com o passar do tempo os indivíduos perceberam que o uso indiscriminado dos recursos naturais poderia prejudicá-los no futuro. É nesse momento que a preservação do meio ambiente se torna uma preocupação global, por ultrapassar as fronteiras dos Estados e por o futuro da humanidade em risco.
À medida que os efeitos do homem sob o meio ambiente se agravaram, o aquecimento global foi identificado, e as catástrofes ambientais foram se tornando cada vez mais frequentes, os Estados passaram a reconhecer a degradação ambiental como um problema de responsabilidade de todos, podendo afetar a humanidade a curto e principalmente em longo prazo.
Hoje, as conferências da Organização das Nações Unidas (ONU), assim como as organizações não-governamentais e outros atores internacionais, incentivam os Estados a se preocuparem com o meio ambiente e sua preservação. Essas conferências, através de seus princípios, buscaram incentivar a preservação ambiental no planeta e aos poucos foram ganhando mais espaço na agenda internacional dos países, que participam cada vez mais ativamente, reconhecendo esta nova ameaça à paz e respeitando os princípios da ONU.
A preocupação internacional ligada ao meio ambiente surgiu na década de 60, com presença em apenas algumas parcelas da sociedade civil, e dos países mais ricos.

Até a presente data já aconteceram vários eventos internacionais patrocinados pela ONU para a discussão de temas ligados ao meio ambiente. Dentre estes quatro conferências são as mais importantes: a de Estocolmo em 1972; a do Rio de Janeiro, em 1992 (ECO-92), a de Johanesburgo, em 2002; e a RIO+20 em 2012. Cada uma delas aprofundou temas relevantes que suscitaram fortes discussões entre os atores internacionais, estatais e não-estatais.

De grande relevância é a discussão em torno do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). A ideia de sua criação surgiu durante a Conferência de Estocolmo, em 1972, quando os participantes decidiram que era necessário criar uma instituição permanente para coordenar e incentivar ações voltadas para a preservação do meio ambiente. Inaugurando a noção de que era necessária uma governança global ambiental, foi identificado o enfraquecimento do PNUMA durante a Eco-92 pela ausência de poder regulatório sobre a questão. Já na Cúpula de Johanesburgo, foi forte o interesse dado à questão de governança por envolver a participação de vários atores, em especial da sociedade civil. Durante a Rio+20 concluiu-se que para a correta atuação da governança global, ligada ao desenvolvimento sustentável, seria necessário ajustar disposição institucional multilateral capaz de coordenar e atribuir sinergia às agendas nacionais para tratar em nível mundial dos problemas que não poderiam mais ser tratados localmente.
Estas discussões colocaram em prova o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que apesar de ser um programa no âmbito da ONU, está subordinado ao ECOSOC e não possui poder regulatório, podendo apenas elaborar estudos e fazer recomendações sobre o meio ambiente, aos países que aderiram voluntariamente.
Ficou claro, especialmente a partir da Rio+20, que existe a tendência de transformar o PNUMA numa Organização Internacional que institucionalize a governança global no âmbito ambiental. Como se sabe, o conceito de governança global refere-se ao conjunto de atores envolvidos no processo de construção de diretrizes e regras relativas a um tema global, com o intuito de direcionar soluções e encaminhamentos que abarquem Estados e outros atores internacionais.

No entanto, a partir de um olhar fundamentado no pensamento de Michel Foucault, filósofo pós-moderno francês, e de Richard Ashley, teórico internacionalista, a questão ambiental ao ser conduzida pelo PNUMA de forma como está sendo construída esta governança pode ser, a expressão de um processo de governamentalidade. Tal conceito é formado pelo conjunto das instituições, dos procedimentos, das análises e reflexões que permitem exercer essa forma bem específica e complexa de poder, que leva em consideração o surgimento de novas ameaças à população, no caso ambiental, a humanidade como um todo, de maneira a influenciar em um modelo de governo que seja moldado nesses objetivos.
Nesse sentido, considerando a questão ambiental como uma ameaça à segurança internacional, o papel da Organização das Nações Unidas como agente possuidor dessa governamentalidade se torna de extrema relevância, sendo importante compreender as estratégias que utiliza para incluir a preservação ambiental entre os seus objetivos, atuando principalmente através de conferências internacionais.
A governança global ambiental é, considerando o que postulam Foucault e Ashley, uma expressão do poder disciplinar, com o intuito de estabelecer a ordem e a obediência dos mecanismos expressada na criação de uma instituição voltada exclusivamente para o tema, com o objetivo de controlar a sociedade internacional para preservar a natureza. Este poder disciplinar se caracteriza pelo controle, por meio da construção simbólica do panóptico, idealizada pelo filósofo Jeremy Bentham na ideia de ver sem ser visto, no qual seria exercido o poder de vigiar tudo o que se referisse às questões ambientais no mundo e de punir o que fosse contrário às verdades produzidas neste âmbito pelos legisladores da governança ambiental global concretizada no PNUMA.
Neste processo, as ONGs aparecem como uma representação da preocupação sobre o meio ambiente e para exigir um posicionamento tanto da Organização das Nações Unidas quanto dos Estados no que se refere à preservação ambiental. Ao mesmo tempo, colocam-se, em muitos aspectos, como opositores a essa dinâmica de institucionalização da governança global ambiental, constituindo-se – de certa forma – como sinais de dispositivos de resistência a este específico exercício de poder nesta relação. Com efeito, para Foucault, dispositivos de resistência vão existir no momento em há poder, onde a resistência será a possibilidade de modificar essas relações de poder.
Com a identificação da escassez de recursos naturais, das mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento global e pelas catástrofes ambientais cada vez mais frequentes, a preservação ambiental se tornou tópico de segurança internacional. E quando se fala em segurança ambiental busca-se a preservação do meio ambiente de maneira a garanti-lo para as gerações futuras pensando no futuro da humanidade sem desconsiderar as necessidades da sociedade atual.
Muito ainda pode ser debatido e pesquisado sobre a necessidade de uma governança global ambiental e sobre a possibilidade de sua construção, em especial no âmbito da ONU e considerando a relevância que a temática ambiental adquiriu, sendo pertinente ainda analisar a relevância do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

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