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quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Papa Francisco e a retomada diplomática entre Cuba e EUA: as transformações nas relações e a religião como fator de influência política

. Christiane Ramos
Acadêmica do 4° semestre de Relações Internacionais da UNAMA


Foram notáveis os acontecimentos da semana passada que revelaram uma (re)aproximação diplomática entre Cuba e Estados Unidos após décadas de relações conflituosas. A Guerra Fria teve um fim. O socialismo/comunismo passou a ser visto como uma prática de governo equivocada. Cuba permaneceu isolada. Mas, um líder religioso foi capaz de promover uma transformação neste cenário. O que possibilitou a ocorrência desta mudança tão significativa nas dinâmicas entre estes dois países? Busquemos responder esta pergunta pelo viés construtivista das Relações Internacionais. Tal resposta não é a única, mas pode ser importante para iluminar e aprofundar os vieses poucos adentrados da questão.
Ao longo da década de 1970, o embate entre as teorias NEO-NEO – conhecido como o Terceiro Debate na disciplina de Relações Internacionais – tomou conta das principais discussões internacionais. Neorrealismo e Neoliberalismo passaram a ter uma particularidade compartilhada (mesmo com todas as divergências teóricas): a parcimônia sistêmica, ou seja, a natureza dos acontecimentos internacionais deveria ser interpretada de acordo com certas limitações imutáveis promovidas pelo SI. Referente ao Neorrealismo, tem-se o equilíbrio de poder e a anarquia internacional; quanto ao Neoliberalismo, sobressai-se a interdependência complexa, bem como a importância dos arranjos de cooperação, promovidos com o intuito de moderar os conflitos intrínsecos ao SI, dentre outras.
Mas, a década de 70 e 80 também foram campos férteis para o desenvolvimento de outras teorias explicativas sobre a condição da política mundial. O construtivismo foi uma delas. Segundo ADLER (1999),

“O valor do construtivismo para os estudos das relações internacionais repousa basicamente em sua ênfase na realidade ontológica do conhecimento subjetivo e nas implicações metodológicas e epistemológicas dessa realidade”.

            Desta forma, tem-se a base teórica necessária para explanar sobre as atuais mudanças nas relações diplomáticas entre Cuba e EUA. Neste sentido, é importante classificar o relacionamento social entre os dois países em pelo menos três momentos diferentes: 1) antes da Revolução Cubana, quando os EUA dominavam a ilha caribenha e tinham naquele espaço, um meio de difusão de sua economia e política externa; 2) após a Revolução Cubana, influenciada pela ideologia comunista – ideia contrária àquela praticada pelos EUA, que provocaram todas as restrições e embargos econômicos sobre Cuba, presenciados até a semana passada; e, por último, 3) estas novas relações construídas atualmente.
            Interpreta-se destas mutações de comportamento que não há uma realidade ontologicamente imposta sobre os agentes sociais das relações internacionais. Ao contrário, os significados são construídos socialmente, bem como a maneira pela qual os agentes resolvem socializar-se. Portanto, esta nova aproximação diplomática entre EUA e Cuba só se tornou possível porque aquela realidade conflituosa da Guerra Fria já havia deixado de fazer sentido na política internacional. Depois, a identidade dos agentes envolvidos também sofreram mutações, por conta do meio social, ou seja, tornaram-se mais abertos à negociação e ao bom relacionamento, e desta forma, a política rígida deixou de ter significado para ambos.
        O construtivismo também é considerado um “meio-termo” nas Relações Internacionais, ou seja, pode ser tido como uma fase de transição entre as teorias positivistas e as teorias pós-positivistas com teor crítico. Neste sentido, em Cooperação e Conflito nas relações internacionais (2009), J. Nye aborda a importância que a figura de um líder pode provocar nas ações praticadas na política internacional. Assim, tem-se a imagem do Papa Francisco como um impulsionador da recomposição diplomática entre os Yankees e a ilha caribenha.


             A Companhia de Jesus é a ordem religiosa a qual o Papa Francisco foi ordenado padre. Jesuítas, como o grande líder religioso da Igreja Católica Apostólica Romana, têm por objetivo o empenho missionário e, ultimamente, passaram a ser reconhecidos pela proteção ao direitos fundamentais do homem. A religião, diferente do que muitos imaginam, não representa falácias produzidas para dominar a mentalidade da população. Na verdade, ela é um instrumento de transcendência humana. Um meio ético pelo qual o homem pode basear seu convívio em sociedade. A ação ética e responsável, abalizadas no amor à Deus é, em todos os momentos, o maior pedido do Papa Francisco aos fiéis (não somente aos católicos).
            Desta forma, respondendo à pergunta feita no primeiro parágrafo, as mudanças nos relacionamentos entre Cuba e Estados Unidos foram possíveis porque estes agentes produziram significados intersubjetivos capazes de causar mutações em suas identidades, que são socialmente construídas. Além do mais, a importância do Papa, através da influência de sua imagem, dos valores, da cultura e da ação ética, promoveu um ambiente que garantiu suporte e confiança, amenizando o cenário de contrariedades entre Cuba e EUA.
        Em plena véspera do Natal, cujas comemorações mantêm sentimento de solidariedade e compaixão ao próximo, uma reflexão sobre as construções sociais da realidade (não somente sobre a reaproximação entre EUA e Cuba) é importante, porque torna a coletividade o principal agente das transformações sociais. A paz, a ética, e a responsabilidade social não são conceitos externos a ação humana, portanto, não podem ser vistos como ontologias.
Contudo – abrindo um espaço na reflexão construtivista – já dizia o filósofo, “a realidade é socialmente construída, mas ontologicamente fundamentada *. Esta é a razão pela qual a vida humana e a busca pela paz e pela amenização dos conflitos ganham sentido e propósito.
            Que o Natal seja um momento de aproximação e amistosidade.
            Um feliz Natal a todos!

Nota:
*Reflexão geralmente realizada pelo teólogo, filósofo, coordenador e professor da disciplina de Teoria contemporânea das Relações Internacionais da Universidade da Amazônia, o Prof. MSc. Mário Tito Almeida.
                       
Referência:
ADLER, E. O construtivismo no estudo das relações internacionais. Lua Nova [online], n.47, pp. 201-246. 1999.
NYE, Joseph S. Jr. Cooperação e Conflitos nas relações internacionais: uma leitura essencial para entender as principais questões da política mundial. Rio de Janeiro: Gente, 2010.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O Papel dos Líderes nas Relações Internacionais

Bianka Neves
Acadêmica do 4° semestre de Relações Internacionais da UNAMA


  O papel dos líderes no contexto internacional torna-se crucial principalmente depois do século XX, com o advento de duas Grandes Guerras no curso da história, onde na última delas, potências conseguiam se reafirmar cada vez mais, por conta da personalidade de seus líderes, bem como dos objetivos dos mesmos. Dois exemplos pertinentes são o Führer da Alemanha, Adolf Hitler, e o Primeiro Ministro Britânico Winston Churchill.
            A linha tênue entre estes dois grandes líderes é o fato de que ambos tinham plena consciência do quanto sua personalidade e imagem podia influenciar toda uma nação. Em alguns casos, até mesmo transcender as fronteiras territoriais. Sabiam manter postura confiável através de discursos e da construção da imagem.
Era crucial, “ter uma marca registrada”, como símbolo de imponência e poder, como no caso de Churchill, onde sua bengala emitia a ideia de poder, diferentemente daquela imagem que teria com outros senhores mais velhos, já que a mesma era um sinal de enfermidade na velhice. Assim como Hitler que tentava se manter a sombra de seu fardamento militar. Segundo Andrew Roberts, em seu livro Hitler e Churchill: segredos de liderança, isso o mantinha igual aos seus colaboradores e militares.
            Ambos sabiam que um líder tem o papel de convencer o povo. Que ele, como dirigente, possuía a vontade necessária para guiar os acontecimentos. Cabia a eles também a dignidade e desejos que toda uma nação depositava, não no Homem em si, mas em um representante que poderia leva-los à satisfação dos interesses nacionais, portanto, tem-se o líder como uma personificação do Estado.
Outro grande ponto é a motivação subjetiva de cada líder. Hitler foi crucial para a proporção que a Segunda Guerra Mundial tomou. O seu fanatismo dizimou milhões de vidas judias. Depois, sua prepotência e tirania assumiram outras formas de discriminação, não mais centradas somente no ódio contra o judeu, mas alastrando-se entre idosos, homossexuais, e tantos mais que entrassem em confronto com a ideologia do “Grande Führer”.
        Joseph Nye, em sua obra Cooperação e Conflito nas relações internacionais (2001) considera que a Segunda Guerra Mundial não foi uma guerra de Hitler, mas que ele teve um papel extremamente crucial em vários pontos da guerra em si. Segundo Nye, as ações do líder alemão na Segunda Grande Guerra tiveram quatro fases importantes. A primeira fase diz respeito à eclosão da guerra, que não foi somente consequência das ações do líder alemão, mas de todos os países envolvidos. Os Estados acreditavam que uma guerra era inevitável, portanto tinham a ideia de que ela poderia ocorrer a qualquer momento.


             A partir da segunda e terceira fases, o Führer é tomado como essencial. O líder alemão desponta com certas características como habilidade, audácia e ideologia belicosa para obter domínio territorial sobre a Europa. Ele simplesmente queria a guerra e trabalhou para que ela fosse levada adiante. Na quarta fase, Nye reitera que o apetite insaciável de Hitler, ao querer sempre mais quando conseguia o “mais”, e sua convicção em si mesmo o levou a “cegueira”, fazendo-o cometer erros que culminaram em seu fracasso.
            Sua ideologia racista promovia o mito da superioridade da raça ariana. Isso acabou levando a Alemanha a perder grandes gênios das Ciências – que não estavam dentro dos moldes estereotipados de Hitler – que poderiam ter desenvolvido estratégias de guerra e principalmente tecnologias bélicas. Levou-o também a subjugar o poder dos Estados Unidos, que possuía um alto contingente de negros e judeus em seu território. Ele ignorou o poder dos EUA por conta da pluralidade étnica que, de acordo com o pensamento do Führer, não poderia representar a força de um país.
            Portanto, o papel destes líderes foi de extrema importância não só para seus países, mas também para o próprio curso da História. A partir de suas ideologias e influências conseguiram conduzir todo um palco de conflitos que marcaram a história e a dinâmica das Relações Internacionais pós-1945, que ainda abrigava certas ideias de Winston Churchill como a cooperação e resolução de conflitos.
  A postura de um líder e a importância das estratégias a partir do legado hostil que Hitler deixou, e principalmente a convicção de que o ser humano possui plenas capacidades de mudar o curso da história e de quão longe ele pode chegar, como no fim da guerra com as bombas de Hiroshima e Nagasaki, onde vimos uma hegemonia se reafirmar, mas, um medo crescer, um medo da figura humana dotada de poderes.
A Segunda Guerra Mundial marcou não somente por seus líderes, e nem só pelo genocídio provocado, mas porque alcançamos algo sem precedentes: fomos longe demais, ao ponto de dispor de poderes para dizimar toda a humanidade com as “novas tecnologias” – armas nucleares – e então a necessidade de evitar que isto aconteça de fato, através de uma profunda crença na nova dinâmica que ali se fez, e onde mais do que nunca, a cooperação se faria extremamente necessária.
      Desta forma, tem-se o indivíduo (líder) como um agente de extrema importância e influência nas dinâmicas do Sistema Internacional. A ele cabe a missão de incorporar as aspirações das unidades nacionais socialmente construídas, que são os Estados, e trabalhar de forma que permita com que ele seja um formulador dos tipos de relações mantidas na arena internacional. Ao mesmo tempo em que incorpora a vontade nacional, ele influenciará, com sua personalidade – seja ela qual for – a ações do Estado. Isso explica a importância que Churchill e Hitler tiveram na Segunda Guerra Mundial.


Referências:
NYE, Joseph S. Cooperação e conflitos nas relações internacionais. Editora gente. São Paulo, 2009.
ROBERTS, Andrew. Hitler & Churchill- Segredos de liderança. Editora Zahar. São Paulo, 2011.
SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Memórias da Segunda Guerra Mundial: Winston Churchill. In: As Memórias de Churchill. Caderno de Ideias, O Globo, 2005. Revista Eletrônica Tempo Presente. Disponível em: http://www.tempopresente.org/index.php?option=com_content&view=article&id=4632:memorias-da-segunda-guerra-mundial-winston-churchill&catid=37&Itemid=172. Acesso em 24 de agosto de 2014.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

O conflito Palestino – Israelense: a construção de uma Paz

Christiane Ramos
Acadêmica do 3° semestre de Relações Internacionais da UNAMA

O sumo pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana, O Papa Francisco, realizou uma visita de três dias ao Oriente Médio. O ato do líder católico revela a grande importância dos valores na dinâmica atual do sistema internacional (SI). Este fato não deve ser analisado apenas como uma questão religiosa, mas, como uma ação política capaz de transformar a realidade do lugar. Se algo é considerado relevante em Relações Internacionais quando afeta a dinâmica do SI, então, uma análise sobre a viagem do Papa ao Oriente Médio é de extremo destaque.
Os acontecimentos históricos são imprescindíveis para entender o conflito atual entre Palestina e Israel. As causas recentes remontam ao fim do século XIX, quando os judeus, até então um povo sem Estado, viviam dispersos, tanto no próprio Oriente Médio, quanto na Europa. Havia entre os Judeus a ideia de uma “terra prometida” situada na Palestina. Entretanto, o lugar já era habitado por maioria árabe.
Com os horrores da Segunda Guerra Mundial (Holocausto), a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou em 1947 a criação de um Estado israelense, que passou a existir em 1948. A migração em massa para, agora Israel, iniciou. E as insatisfações apareceram. O conflito entre os dois povos não cessa desde então.
Os seguidores de teorias positivistas certamente não entendem a importância da visita do Papa ao Oriente Médio. Eles acreditam em uma lógica permanente na política internacional. Que o poder de um agente pode ser quantificado. Questões materiais (militar – bélico, econômico) são exaltadas.
Em contraposição, os pós-positivistas veem o poder de forma qualitativa. Ideias, crenças, valores e cultura, ou seja, aspectos imateriais são mais importantes. De nada vale armamentos ou exércitos, se esta ideia não é difundida.
Por isso, a religião, como valor, é de extrema importância para a política internacional. Para o construtivismo, o papel dos líderes é fundamental. Aliás, mais do que eles mesmos, suas personalidades. O Papa Francisco se mostra sempre aberto às discussões. Não só às questões dogmáticas da Igreja Católica, mas às relações entre os agentes e mudanças no cenário internacional.
A imagem com a legenda “El abrazo de 3 religiones” possui um grande valor simbólico: o Papa conseguiu reunir forças religiosas que possuem uma luta histórica – palestinos e israelenses – cujo relacionamento cultivado está sendo de grande conflito e de não aceitação recíproca. Constroem intersubjetivamente a ideia e a realidade conflituosa.
O Papa Francisco pede incessantemente “Paz”. Contudo, esta não possui uma existência ontológica.  Não se poderá vislumbrá-la se ambos os lados, que se relacionam, não alimentarem a intenção de construí-la. Os judeus já possuem um Estado legitimado pela comunidade internacional. Contudo, os palestinos ainda não podem sentir orgulho por um Estado próprio.
Alexander Wendt é considerado um “meio-termo” nas Relações Internacionais, assim como Emanuel Adler. Isto significa que por mais que considerem a estrutura como mutável, que não há existência ontológica das coisas do mundo e que valores imateriais são indispensáveis, a estrutura pode em algum momento se apresentar do modo como os positivistas a enxergam. Wendt inclusive, diz que a “anarquia é o que os Estados fazem dela”, portanto, é construída, produzida intersubjetivamente e se torna um senso comum.
Logo, pode-se acreditar, sim, que o Estado seja uma possibilidade para a política mundial. Mas o que é uma política de Estados hoje poderá não ser futuramente. A realidade é socialmente construída e mutável. O estado poderá perder importância e deixar de existir.
O desejo de paz não está sendo apenas uma vontade religiosa. Quando esteve no Oriente Médio, o Papa Francisco convidou o chefe político israelense, Shimon Peres e o líder palestino Mahmud Abbas para um encontro histórico em Roma, que aconteceu no último dia 08 de junho, domingo.
O encontro foi marcado pelo cunho religioso. Contudo, percebe-se o teor político. O Papa afirmou que aquele era um momento de trégua (no conflito). Na véspera do encontro, em sua conta oficial no Twitter, disse que “a oração pode tudo”. Ou seja, a questão religiosa tem tanto poder de contribuir para a construção social das relações internacionais, quanto o armamento e a economia, por exemplo.
Assim, por meio de questões de valores e crenças, tenta-se mostrar para os amantes do realismo que a construção de uma realidade pacífica é possível se os agentes trabalham para isso. Não será uma suposta “anarquia estrutural” a definir a identidade e interesses dos agentes. Esta definição só é possível quando eles se relacionam – a identidade relacional.
A realidade atual que foi construída por ambas as partes é de rivalidade. Em meio ao conflito, a construção não levará nem a cooperação, nem à paz. Os conflitos entre as partes são intensos e abarrotados pelos valores de cada um. Não há entendimento. Assim, é bastante difícil de chegar a um consenso. Mas, se ambos resolverem que a paz seja possível e agirem de forma a construí-la, chegarão a este fim. No construtivismo há transformações. Não se sabe para onde elas caminham. A única certeza é de que relações pacíficas tem uma grande chance de gerar cooperação. A paz é socialmente construída.
A Palestina constrói juntamente com os outros agentes a ideia de que os Estados são necessários. Se a relação entre eles expressa isso, logo a Palestina pensará e agirá também a legitimar esta realidade – a relação entre os agentes constrói a estrutura, e a estrutura influencia os agentes.
Cabe agora esperar para ver o que será feito das relações entre Palestina e Israel, e como o Ocidente se comporta diante delas. Na estrutura, não somos apenas atores fadados a interpretar um papel artificial, mas devemos participar ativamente da construção social das relações internacionais. Assim, agindo como verdadeiros agentes. Transformadores da própria realidade.





segunda-feira, 2 de junho de 2014

Eleições Ucranianas: uma visão da Teoria Construtivista nas R.I.

Raylson Max
Acadêmico do 3° semestre de Relações Internacionais da UNAMA


Sabemos que as eleições internas dos países são bastante importantes para os eleitores. São de suma importância para o contexto geopolítico internacional. As eleições ucranianas, onde os inúmeros assuntos de interesse da política internacional estão voltados, a importância é maior devido as questões que ocorrem no leste europeu e os países do ocidente acompanham de forma direta ou indireta. O que ocorre na região euroasiática do mundo pode ser analisado à luz das teorias construtivistas.
           Por questões históricas, para se entender melhor o que está acontecendo e o porquê de estarem acontecendo, é bom entender o que os cidadãos ucranianos reivindicam para a melhora de seu país. A identidade da Ucrânia está sendo altamente mexida influenciada por movimentos étnicos russos. A “Revolução Laranja” e o “Euromaidan” é crucial para entender os primórdios desse movimento o qual “desaguou” nas eleições ucranianas onde o oligarca Petro Poroshenko, o “Rei do Chocolate” como ficou conhecido, ganhou com cerca de 54% dos votos. Ele foi seguido da ex-primeira ministra Yulia Tymoshenko, do Partido Pátria, com 13,9%.
Para entender as eleições na ótica da teoria construtivista, é preciso saber os pontos seminais da teoria, a qual vem ganhando bastante visibilidade no cenário da análise internacional.
A teoria construtivista parte do princípio de que agente-estrutura estão sendo co-construídos em um movimento de retroalimentação continuada contínua. Outro ponto bastante importante é a questão da identidade a qual leva e/ou adquire como valores, normas, ideais, cultura. Há ainda a importância do papel líder.
No construtivismo, a identidade é relacional, ou seja, diferente do que os positivistas dizem, a identidade não é fixa, fidedigna.  A possibilidade de ser flexível, para os positivistas, é ínfima ou mesmo beirando à zero. Segundo Adler, os agentes definem identidades que expressam seu interesses­­. A relação social entre os agentes é de suma importância para que uma estrutura seja formada. Sendo assim, o ciclo se torna vicioso. Ou seja, a relação entre os agentes formam a estrutura, e a estrutura influencia os agentes.
A maioria dos ucranianos sonha com uma democracia de fato. Libertos de “bloqueios” de outros países e muito mais integrado com o resto da Europa. O desafio do presidente eleito é nada menos do que encarar essa realidade juntamente com os cidadãos que vivem na Ucrânia, sejam os de etnia russa ou não. Colocar a Ucrânia no eixo das principais rotas econômicas. Inserir-se na UE e mostrar a sua identidade para aquela região e para sua população. O papel do Líder/Presidente, agora, é fundamental para que ocorram mudanças necessárias para que o país seja estabilizado na área sócio- econômico advindo de fraquezas da política externa da Ucrânia.
Na verdade, a Ucrânia está em um momento decisivo de sua formação como um Estado. Por um lado, tem-se a perda de sua “soberania”, cujo significado e sentido desta expressão para a dinâmica mundial foi construída intersubjetivamente pelos agentes da Estrutura. Há neste momento a ideia de soberania como algo a ser ainda respeitado, valorizado.
Assim, a situação deste momento é a seguinte: o futuro presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, terá uma grande escolha a fazer. Ou se alia ao Ocidente pela construção de uma cooperação diante da União Europeia, ou ficará à sombra de uma potência eurasiática. Há uma terceira opção. Pode escolher manter relações tanto com Rússia quanto com o Ocidente.
De qualquer forma, é inegável que a população, como detentora de poder, pode escolher seu futuro nas urnas. A construção deste futuro, na verdade é incerto. Não se sabe para onde caminham as mutações e transformações do sistema internacional. Contudo, é obvio que se se cultiva boas relações atualmente, o futuro tende a ser pacífico, caso contrário, há que se esperar o pior.

O mais importante disto tudo é que a Ucrânia possui o poder de se relacionar com os demais agentes da estrutura, para assim, conjuntamente vislumbrar fazer parte das relações mútuas do sistema internacional. A população é importante porque juntamente com a identidade, o país formará seus interesses. Logo, o líder apreenderá estes interesses e formulará a política externa da qual a Ucrânia baseará seus passos na política internacional. Cabe agora esperar para ver o rumo para onde caminhará a política internacional frente à crise ucraniana.

Referências




BUENO, Adriana Mesquita Corrêa. Perspectivas contemporâneas sobre regimes internacionais: a abordagem construtivista. Rio de Janeiro Campus (PUC-Rio), Rio de Janeiro, Brasil, jul 22, 2009.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

EUA e Snowden: uma visão construtivista do assunto

Breno Damasceno
Acadêmico do 3° semestre de Relações Internacionais da UNAMA


A questão da espionagem comercial e de líderes globais colocou em cheque os motes de política externa dos EUA e como o mesmo pode ou não atuar nesse sentido. Sabe-se que esse tipo de tática para coletar informações importantes de países e empresas não é nova, porém ganhou grande repercussão por envolver nomes importantes como a chanceler alemã Angela Merkel e a empresa Petrobras, aqui no Brasil. Partiremos então para o comportamento dos EUA em relação ao vazamento de informações por conta dessa estratégia diplomática e a análise dos interesses desse agente.
A análise construtivista merece algumas ressalvas. Para entender como funciona o comportamento dos agentes, merece primeiro entender os interesses dos mesmos. Um dos pressupostos do construtivismo é ressaltar que os agentes demonstram seus interesses por conta da busca de uma identidade, a qual, depois de estabelecida acaba gerando novos interesses. Sendo assim esses agentes revogam constroem uma nova estrutura, colocando nas palavras de Emmanuel Adler, nesse sentido, temos que “o construtivismo mostra que mesmo as nossas instituições mais duradouras (Estados) são baseadas em entendimentos coletivos” essas instituições irão buscar o que os construtivistas chamam de “identidade relacional”.
Tendo em vista esses preceitos, podemos relacioná-los aos acontecimentos dos Estados Unidos na questão da espionagem. Uma das atuações que mais chamou atenção nesse sentido foi a espionagem telefônica de cidadãos americanos e do mundo todo pela Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) e até mesmo de líderes internacionais, essa coleta de dados mostrou um lado até então, visto por muitos, como negativo do governo Obama, o qual propôs o fim dessa coleta de dados telefônicos pela NSA.
A nova proposta prevê que dados sejam armazenados, mas pelas próprias companhias telefônicas e pelo período de 18 meses ¹.  A NSA poderia, então, solicitar as informações de que necessita com uma autorização judicial. Esse exemplo ressalta a questão do Realismo Construtivista, que não nega a importância do estado e suas ações, mas que para a busca de interesses ele dependerá de forças internas, nesse caso a uma instituição.
Sabe-se que depois dos atentados de 11 de setembro essas questões de se resguardar quanto aos ataques terroristas ficou mais forte. Logo um dos interesses citados por Barack Obama, no seu discurso na Assembleia Geral da ONU no ano passado, foi que “os EUA são excepcionais, em parte porque demonstramos o desejo, através do sacrifício de sangue e riqueza, de defender não apenas nosso interesse próprio, mas os interesses de todos", ou seja, o presidente tentou salientar que as estratégias feitas foram para beneficiar também aos seus aliados, e admite que erro maior seria deixar os mesmos a mercê de riscos iminentes².
Cabe colocar nessa questão também um dos principais pontos do Construtivismo, o papel do Líder, que deve tomar decisões que ora concordem com seus aliados, ora os desagradem. Tais decisões devem ser feitas com cuidado para que a imagem do mesmo não seja defasada ou até denegrida na estrutura internacional, saber moldar essas disposições é essencial para manter-se no poder.
Em linhas gerais, as premissas do construtivismo realçam os fundamentos transformadores de ideias e de mútuas relações de construção e co-construção tendo como base os meios usados para tal fim. Nesse contexto podemos dizer que o construtivismo explica o quanto as relações entre EUA e a estrutura internacional mudam diante de um caso que afeta vários agentes, segundo Wendt, “o melhor de dois mundos” acaba sendo visto como uma relação que ao mesmo tempo prejudica negociações e fortalece outras, bastando apenas caber a cada agente saber o que procura e juntamente a isso notar se tal decisão afetará a outros.

Referência 
BUENO, Adriana Mesquita Corrêa. Perspectivas contemporâneas sobre regimes internacionais: a abordagem construtivista. Rio de Janeiro Campus (PUC-Rio), Rio de Janeiro, Brasil, jul 22, 2009.
CASTRO, Thales. Do construtivismo e seus postulados – o terceiro grande debate das Relações Internacionais. In.: _____ Teoria das Relações Internacionais. Brasília, Funag. 2012. p. 385-389.

¹SCHOSSLER, Alexandre. Obama deve propor fim da coleta de dados telefônicos pela NSA. Acesso em: 6 mai 2014. Disponível em: < http://www.dw.de/obama-deve-propor-fim-da-coleta-de-dados-telef%C3%B4nicos-pela-nsa/a-17518657>.

²UCHOA, Pablo. Obama promete rever espionagem, mas diz que mundo hoje é mais estável. Acesso em: 6 mai 2014. Disponível em: < http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/09/130924_obama_espionagem_ru.shtml>.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

(RE) CONSTRUÇÃO DA GRANDE RÚSSIA? PONTOS PARA ANÁLISE A PARTIR DA TEORIA CONSTRUTIVISTA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Prof. MSc. Mário Tito Almeida
Docente de Teoria Contemporânea das Relações Internacionais da UNAMA
         A teoria construtivista das Relações Internacionais vem se constituindo, ao lado da neorrealista e da neoliberal, como uma das mais utilizadas na contemporaneidade na análise dos fatos internacionais.
Segundo ADLER (1999),
 “O construtivismo está no meio termo porque se interessa em entender como os mundos material, subjetivo e intersubjetivo interagem na construção social da realidade, e porque, mais do que considerar exclusivamente como as estruturas constituem as identidades e os interesses dos agentes, ele pretende também explicar como, antes de tudo, os agentes individuais constroem socialmente essas estruturas.”

Assim, sendo uma “via média” entre as teorias positivistas e as pós-positivistas, o construtivismo defende que para entender a dinâmica do sistema internacional (SI) é preciso ir além das considerações de fatores materiais e ponderar a relevância das variáveis imateriais, como valores, crenças, normas e ideias.
           Este instrumental teórico construtivista pode ajudar a compreender o que vem acontecendo na Eurásia, a partir dos movimentos da Rússia na região. O presente artigo objetiva ser um levantamento de questões relacionadas a este tema, em especial a análise das motivações russas em sua política externa com relação aos países vizinhos, em uma abordagem inicial que pretende abrir novos pontos de análises posteriores aos meus alunos de Relações Internacionais

Para os construtivistas a realidade é socialmente construída e, no movimento constante dos agentes que moldam a estrutura e por ela são moldados, a relação entre os Estados e todos os outros agentes do SI vem sendo continuamente moldada por meio das identidades que conformarão seus interesses. Nesse sentido, as ideias, os valores e as crenças exercem papel relevante. Por elas um Estado define os interesses no sistema internacional, seja no sentido da cooperação, da expansão de seu poder-força ou da disposição ao conflito.
Coerentemente com o que WENDT (1992) já afirmara em seu artigo seminal, a anarquia (bem como a governança, a guerra ou a própria paz) é aquilo que os estados fazem disso. Ou seja, os interesses e as ações de um Estado no SI dependem de como este se compreende como tal. Isto significa que, de acordo com WENDT (1987), a identidade precede os interesses. Em outras palavras: dependendo de como a identidade é construída (no sentido relacional e coletivo do termo) os interesses desse Estado serão definidos.
Aplicando estes conceitos às ações da Rússia na Eurásia hoje, pode-se perceber, grosso modo, três movimentos ao longo da segunda metade do século XX até nossos dias.
Num primeiro momento, durante a guerra fria, percebe-se a consolidação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), como a identidade que explicita o ideal soviético em toda região da Ásia Setentrional e do Leste Europeu. Sustentado pelo comunismo russo, a organização política, econômica e social da URSS espelhava a identidade de uma grande Rússia, caracterizada, entre outras coisas, pelo confronto ideológico e militar com os EUA. Seus interesses, por isso, se configuraram na busca de hegemonia no sistema internacional por meio de estratégias de domínio e de sustentação do avanço comunista no mundo, tais como manutenção de regimes comunistas nos vários continentes (Cuba, Vietnã, Afeganistão...) e a corrida nuclear e espacial.
O segundo momento corresponde ao período do imediato pós-guerra fria, no qual, com o fim da URSS, a Rússia viveu momentos de reidentificação. Neste contexto, foi crescendo a ocidentalização da Rússia na busca da construção de um grande país Europeu, na linha do que preconizaram Mikhail Gorbatchev, com a Prestroika e a Glasnost, e Boris Yeltsin. Assim, a partir desta identidade, foram sendo moldados os interesses russos no SI. Tais interesses visavam à participação ativa da Rússia nos fóruns multilaterais de construção da nova ordem mundial, no estreitamento de conversações com vistas à participação efetiva na União Europeia, na aproximação com as estruturas de mercado internacionais, na ampliação do diálogo com outros Estados com interesses de cooperação comum (BRICS, G-8, OMC...), entre outros.
O terceiro momento parece ser este que estamos vivendo atualmente. Trata-se, de uma retomada ideológica, que marca o fim da visão interna da Federação Russa como "um grande país europeu", e manifesta a recriação e consolidação do projeto russo de "um grande país", que, sob o aspecto histórico das grandes potências, não representaria nenhuma novidade, visto que tal projeto também foi posto em prática, em épocas diversas por EUA e Grã-Bretanha, por exemplo, conforme refere-se DUGIN (2004).

Neste sentido, a deliberações tomadas pelo Presidente Vladimir Putin relativos aos Estados vizinhos (mais recentemente na Ucrânia, com a questão da Crimeia) obedeceriam a este processo de (re)construção da identidade da Grande Rússia como uma nação que pode influenciar fortemente nos processos do SI contemporâneo. Para tal, uma grande quantidade de projetos de alto custo em setores diferentes, tais como o tecnológico (modernização do parque industrial, por meio de inovações científicas, sustentadas por financiamento de pesquisas na área), o militar (criação do grande exército russo), o religioso (conceito de "grandes religiões tradicionais da Rússia"), o cultural (reafirmação dos valores russos e da "grande cultura russa") e o geopolítico (que fundamenta a "grande ascensão geopolítica", incluindo a reintegração do país na União Aduaneira Eurasiática e na federalização de regiões nos estados vizinhos que contam com maioria russa), vêm sendo projetados e implementados para estabelecer esta imagem.
Como se vê, os fatores que influenciam na compreensão do que vem acontecendo com a Rússia e Estados vizinhos (e que, pela interdependência complexa, interfere em todas as relações do SI contemporâneo) vão além dos econômicos e políticos (fatores eminentemente materiais) e alcançam vieses imateriais, não quantificáveis. Para a teoria construtivista, a não atenção a estes, levou os seguidores das teorias racionalistas (neorrealismo e neoliberalismo) a não serem capazes de compreender os rumos que o SI tomaria, em especial nos episódios da queda do muro de Berlim e do esfacelamento da URSS, bem como dos atentados de 11 de setembro de 2001.
Assim, acredito que a teoria construtivista oferece elementos importantes e interessantes para compreender além do ôntico o que vem acontecendo no leste europeu e na eurásia. A partir do que se abordou acima, questões se abrem e pontos de partida para pesquisas se manifestam.  São áreas pertinentes e relevantes para quem quiser entender mais a fundo os fatos internacionais.
Boas pesquisas!

REFERÊNCIAS
ADLER, E. O construtivismo no estudo das relações internacionais. Lua Nova [online], n.47, pp. 201-246. 1999.
DUGIN, Alexander. The Eurasian Idea: what is eurasianism today? What forms the concept of Eurasia? Seven senses of word eurasianism and evolution of notion of eurasianism. International Eurasian Movement. 2004. Disponível em: <http://evrazia.info/modules.php ?name=News&file=article&sid=1884>. Acesso em: 27 abr. 2014.
NOGUEIRA, J.P.; MESSARI, N. Teoria das relações internacionais: correntes e debates. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
WENDT, A. The agent-structure problem in international relations theory. International Organization, vol. 41, n. 3, pp 335-370, 1987.
___________. Anarchy is what States Make of it: The Social Construction of Power Politics. International Organization, Vol. 46, n. 2, pp. 391-425. Spring, 1992.