quarta-feira, 9 de julho de 2014

Idealismo Clássico

Marcelo Alexandre Costa
Acadêmico do 7° semestre de Relações internacionais da UNAMA


Com o intuito de melhor discorrer sobre o idealismo clássico, ou liberalismo clássico como preferem alguns autores, é válido destacar preliminarmente a afirmação de Castro (2012) em que, “o liberalismo clássico defende o pacifismo de cunho cooperativo, transparente e progressista além do conjunto de princípios jusnaturalista[1] [...]”. É perceptível que no liberalismo clássico a importância do indivíduo e sua interação em sociedade, bem como os valores e normas advindos dessa percepção são centrais nas análises teóricas dos autores clássicos, como também corrobora Sutch e Elias (2007), “for the canonical thinkers in thistraditionmoralityhas a key place in our political thinking as ultimatily it isindividuals, ratherthanstates, that are importante in international relations (as all in life) ”. No decorrer deste texto, tratarei de expor brevemente os ensinamentos de alguns dos mais importantes autores clássicos que, ao final, conformaram em um entendimento mais completo acerca da teoria idealista em Relações Internacionais.


            A começar pelas proposições de Marsílio de Pádua (1285 – 1343), que possui uma parcela significativa de contribuição para a construção do pensamento liberal clássico. Através de sua obra Civitas, o autor traz soluções práticas para tratar os problemas de convivência entre as pessoas, bem como os possíveis conflitos inerentes desta experiência. Pádua cria, dessa forma, uma sociedade dividida em ramos específicos, como: agricultura, financeiro, artesanato, exército, clero e o governo. Sendo que este último tem o papel primordial de impor a ordem dentro da comunidade com o apoio do exército (poder político), como mecanismo para alcançar a paz mesmo antes da consolidação dos Estados westfalianos.
            Em segundo lugar temos Thomas More (1478 – 1535) que contribuiu categoricamente com sua obra Utopia, a partir de suas proposições acerca de uma organização política interna coesa, semelhante a um regime presidencialista, voltada para contrabalancear abusos tirânicos do governo, entre o órgão executivo e legislativo. Mas a importância desse teórico para as Relações Internacionais refere-se à questão moral da guerra e, consequentemente, na legitimidade interna para tal ação. A noção de guerra justa, levando em consideração as justificações para uso do recurso da força pelos Estados agredidos contra os agressores, os custos morais da guerra e o entendimento de que ela é travada por nações que permitem os abusos tirânicos internos, são os mais importantes legados desse autor para a formação teórica idealista.
            Abade de Saint-Pierre (1658 – 1743) defende uma proposta de pacificação com base territorial na Europa por meio do compartilhamento de valores comuns. No caso específico do seu livro (Projeto para tornar perpétua a paz na Europa) o ideário católico presente entre as monarquias europeias, como afirma Sarfati (2005) “a vinculação dos soberanos católicos à sociedade europeia impediria o mau uso do poder, desestimulando iniciativas como a invasão de outros territórios ou o bloqueio ao comércio internacional” (SARFATI 2005). O ponto mais importante aqui vai além de valores abrangendo, portanto, interesses comuns sendo visualizada claramente no estabelecimento da Comunidade do Carvão e do Aço em 1951, ou seja, o próprio processo de construção de confiança mútua e o aprofundamento da interdependência econômica e comercial entre as nações asseguraria a perpetuação da paz.
Não podemos olvidar das contribuições positivas de Hugo Grotius (1583-1645) para a consolidação do idealismo, que defendia a proeminência do Direito Internacional sobre as frágeis e conturbadas relações entre os Estados. Afirmava que as regras e normas acordadas em tratados ou convenções internacionais seriam respeitadas e cumpridas[2], logo a natureza dos homens e dos Estados estariam, consequentemente, contidas pelos princípios do Direito Internacional. Em outras palavras buscava através da normatização do comportamento humano, com base no direito natural e nos costumes no relacionamento entre os governos, suprir a ausência de um poder central coercitivo no âmbito internacional, onde os aderentes se sentissem obrigados a seguir tais regras e, acima de tudo, aderi-las como padrões de conduta ideais para o bem estar entre as unidades políticas.


            Finalmente, Immanuel Kant (1724 – 1804) configura-se como um dos mais importantes teóricos liberais e sua análise não poderia ficar de fora deste texto. Kant abordou a questão do ordenamento internacional com base no princípio de que todo o indivíduo deve ser considerado e respeitado como um agente autônomo, isto é, com suas próprias liberdades individuais inerentes, em que a ausência desse pensamento materializa-se, portanto, na fonte de conflitos entre os Estados. Outro argumento central da análise de Kant faz referência ao estado de natureza do sistema internacional, tido como instável e injusto, que perpetuava os conflitos entre as unidades políticas. Portanto, propõe que o estabelecimento da paz precisa superar o atual estado de natureza, “a just legal and political regime can break that cycle exposing a genuine harmony of interests” (SUTCH; ELIAS 2007).


            É com base nesses autores clássicos que podemos formar uma compreensão mais precisa acerca das proposições idealistas clássicas. Em suma é vital que possamos compreender que os posicionamentos dos clássicos fundamentam as visões contemporâneas liberais sobre as relações internacionais (impacto da interdependência, os benefícios do livre comércio, segurança coletiva, direitos humanos etc.), ainda o liberalismo clássico se apresenta como um conjunto de normas e princípios morais que refletem a importância das liberdades e direitos individuais (SUTCH; ELIAS 2007), que por sua vez orientam as diversas vertentes liberais hoje presentes, como o liberalismos institucionalista e o sociológico.

Notas:
¹ Vide pg. 656, in BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1ª ed., 1998. Vol. 1.

² Procedendo a partir desse posicionamento a expressão em latin “pacta sunt servanda” – os pactos devem ser cumpridos.


 Referencias:
BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1ª ed., Vol. 1, 1998.
CASTRO, Thales. Teorias das Relações Internacionais. Brasília. Ed. FUNAG, 2012.
SARFATI, Gilberto. Teoria das Relações Internacionais. São Paulo. Ed: Saraiva, 2005.
SUTCH, Peter; ELIAS, Juanita. International Relations: the basics. New York, USA. Ed. Routledge, 1ª ed., 2007.



Nenhum comentário:

Postar um comentário