sexta-feira, 24 de outubro de 2014

ONU aos 69 anos e a Ordem Multicêntrica: As Perspectivas de Mudança no Sistema Onusiano

Christiane Ramos
Acadêmica do 4° semestre de Relações Internacionais da UNAMA


A Organização das Nações Unidas foi criada em 1945, após a Segunda Guerra Mundial. A organização representa a institucionalização da governança global sobre a paz e a segurança internacionais. Os temores de que houvesse outro conflito de proporção global, possibilitou que os Estados passassem a enxergar a cooperação como um meio de construção da paz.
Após a Segunda Guerra Mundial, foi possível perceber um novo reordenamento da política internacional. Dois polos de força contrários começavam a ser formados, tendo como “líderes” de um lado os Estados Unidos e de outro, a União das Republicas Socialistas Soviéticas (URSS). A ordem, naquele momento, era a do alinhamento à uma das forças, o que representava uma espécie de equilíbrio de poder centrado entre duas grandes potências, onde os demais Estados com menor poder-força, se aliavam aos Estados com poder-força mais elevado.
Durante o período da Guerra Fria, a ONU esteve estagnada, principalmente o Conselho de Segurança. Para que seja realizada uma ação com decisão advinda deste órgão, é necessário aprovação unânime. Contudo, influenciados pelas ideologias e ações contrárias, os membros permanentes do Conselho (Estados Unidos, Reino Unido, China, França e União Soviética) possuíam dificuldades para cooperar entre si, portanto não se chegava a um consenso sobre o que deveria ser feito para alcançar a paz e segurança internacionais. Segundo SARDENBERG (2013, p. 61),

“Os cinco membros permanentes, embora tenham interesses em comum no Conselho, nem sempre formam um grupo em si. Até meados dos anos 80, as desavenças entre EUA e URSS eram as grandes responsáveis pela pouca relevância do Conselho”.

            A derrocada URSS e o fim da Guerra Fria possibilitaram uma quebra das correntes da bipolaridade. Os atores não estatais passaram a ganhar notoriedade e, novas “potências” econômicas emergentes destacavam-se não pela qualidade da força bélico-militar, mas por possuírem uma economia forte, tornando-se capazes de agir em um sistema internacional livre das sombras das potências.

Na verdade, a corrente Neoliberal das Relações Internacionais considera que o período após a Guerra Fria pode ser chamado de unimultipolaridade. Logo, passou-se de um sistema bipolarizado para um meio ao qual não há centralidade visível de poder, pois as fontes e recursos de poder são variados. Há uma potência (EUA), que no entanto, não comanda ou lidera a política internacional.
Deste modo, o sistema internacional passou a sofrer algumas modificações, principalmente no que se refere ao direcionamento do poder global. Assim, as reivindicações sobre o órgão seleto e restrito da ONU – Conselho de Segurança – ganharam força. Países como a Alemanha, Brasil e mais recente, a Venezuela acreditam que possuem capacidade para requerer uma cadeira no Conselho.
GUERREIRO (1995) e AMORIM (2005), apesar de tratarem de momentos diferentes as relações que envolvem a ONU, possuem um ponto em comum: acreditam que a organização deve se adequar ao contexto e aos tipos de relação entre os atores do sistema internacional. Isto significa que, conforme as dinâmicas no cenário internacional mudam ou se transformam, a ONU, da mesma forma, deve se adaptar ao contexto da realidade internacional vigente, para vislumbrar atingir seus objetivos.
A 69ª Assembleia das Nações Unidas, ocorrida no dia 24 de setembro de 2014, foi um grande palco de discussões acerca do tema, decorrente da necessidade de uma reformulação do Conselho de Segurança e das Nações Unidas. De acordo com o discurso de presidente venezuelano Nicolás Maduro (2014),

“Hoy Naciones Unidas tiene que adaptarse a um mundo multipolar, multicéntrico, pluripolar, com nuevos actores en el mundo. Con países y regiones emergentes que tienen voz propia, pensamiento propio, aspiraciones. Naciones Unidas tienen que adaptar su organismo”.

Maduro acrescentou ainda a necessidade de uma reformulação da Secretaria Geral, pois acredita que o órgão tem o dever de escutar e representar todos os membros. Abordou a conveniência de reconfigurar o funcionamento da Assembleia Geral, dando-lhe um papel protagônico, e que se discutam realmente os temas importantes da agenda internacional. Admite, portanto, a inevitabilidade de se construir um novo sistema das nações unidas para a paz em um mundo multipolar.
A restrição ao Conselho de Segurança impede os Estados, que não possuem uma cadeira permanente, de serem ouvidos. O fato de os membros do Conselho conservarem grande poder bélico e militar já não suporta mais a tese da restrição, pois a segurança e paz internacionais (objetivos da ONU e do Conselho de Segurança) são difusos, e estão diretamente ligados à questões humanitárias, como a fome, pobreza, recursos naturais, dentre outros.
Sendo assim, quando se trata dos 69 anos da ONU e das perspectivas de reconfiguração do sistema onusiano, é imprescindível relatar que a reforma vai além de questões estruturais. Deve ser notado que os discursos, os modos de significações, a forma de pensar e agir dos Estados e das Nações Unidas, como um sujeito de Direito Internacional, deve ser repensado. Desta forma, a esperança é que os clamores por reformas sejam ouvidos e que estas mudanças realmente ocorram, promovendo assim, a indiscutível e necessária reformulação do sistema das Nações Unidas.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Celso. A ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Relações Exteriores, publicado na "Revista Política Externa", vol. 14. http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outras-comunicacoes/ministro-estado-relacoes-exteriores/a-onu-aos-60-artigo-do-embaixador-celso-amorim>. Acesso em: 15 de out. de 2014.Visualizado às: 22:18.

GUERREIRO, Ramiro Saraiva. ONU: um balanço possível. Estudos Avançados 9 (25), 1995.

SARDENBERG, Ronaldo Mota. O Brasil e as Nações Unidas. Brasília: FUNAG, 2013.


YOUTUBE. Nicolás Maduro, Discurso completo en la Asamblea General de la ONU, 24 septiembre 2014. < https://www.youtube.com/watch?v=nEls1zezqZQ>. Acesso em: 16 de out. de 2014. 

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